25.6.20

o 'cooper' e o trânsito



um corredor vai, avança,
livre, suado, contente.
vence buracos, perigos,
tombos sem dor aparente.


vai pacato e vai altivo
como um dono vai, tranqüilo...
nós o vemos – ele segue
a fazer o seu destino.


e nós aqui, amarrados
uns aos outros, descontentes
neste ônibus vil – quebrado! –
preso como com correntes


pesadas aos outros carros
ansiosos, apertados
como apertados estamos,
como à morte vai o gado.


nós o vemos – ele avança,
de toda amarra liberto.
nós ficamos – tristes párias
exilados no deserto.


ele segue – sempre avante:
o mundo é rua sem fim.
nós aqui – até que o trânsito,
por encanto, siga, enfim.


longe vai o corredor,
longe vai, sem empecilho;
já nem bem o vemos mais
de dentro do coletivo.


quem me dera, corredor,
fugir assim, satisfeito,
e com meus tênis vencer
as falhas deste imperfeito


mundo. ó corredor olímpico,
que ostentas teus dias de ouro
contra este sem graça e imundo
ônibus de mau agouro.


quisera ir – mas aonde?
à praia; beber o orvalho
da serra, talvez... – mas não posso:
há um chefe, há um trabalho...


o corredor corre, corre
feliz, e corre tão bem!
e nós, cabras de presépio,
dizemos, pastando: amém!



.bcg.